Talvez uma das maiores dificuldades enfrentadas pelo Poder Judiciário está em fazer com que o devedor de alimentos mantenha-se adimplente.
Por isso mesmo, a única forma de prisão civil contemplada pelo ordenamento jurídico brasileiro atualmente é a do devedor contumaz de alimentos.
Tal garantia decorre da natureza jurídica dos alimentos, que compreendem a prestação para o sustento de alguém necessitado, tais como a própria alimentação, vestuário, medicamentos e habitação, incluindo também o sustento intelectual e moral. Tecnicamente, os alimentos são a obrigação imposta a alguém, em função de uma causa jurídica prevista em lei, de prestá-los a quem deles necessite.
É que, muitas vezes, até mesmo a determinação da prisão civil não é suficiente para coagir o devedor de alimentos à sua prestação, eis que muitas vezes ele não tem emprego formal ou paradeiro certo, tornando a medida inócua.
Neste contexto, com a abertura do mercado de consumo e a tendência crescente dos brasileiros a se socorrerem das benesses do crédito, alguns operadores do direito cogitam a inclusão dos dados do devedor contumaz de alimentos em cadastros de inadimplentes como um mecanismo eficaz para forçá-lo a prestar os alimentos com regularidade.
Essa tendência segue paradigma da Lei nº 13.074/2003, da Província de Buenos Aires, na Argentina. No Brasil projetos de lei semelhantes tramitam no Congresso Nacional. Citem-se o PL 6107/02, PL 405/2007, PL 405/2008, PL 7841/2010 e PL 119/2011. Nenhum desses projetos de lei ainda foi aprovado.
Contudo, é cediço que, mesmo não havendo norma que regula a matéria, não há norma proibitiva da medida no nosso ordenamento jurídico. Isto porque a lei determina que o juiz deve buscar, sempre que possível, a efetividade das decisões judiciais, com a determinação de providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
Veja-se que nas demais execuções judiciais, alguns Tribunais já adotam o lançamento automático dos dados do executado nos cadastros de inadimplentes por meio de convênio firmado com o Serasa. O tema já foi objeto de estudos e escritos no artigo: “A propositura de execuções judiciais gera lançamento imediato nos cadastros de inadimplentes”. Esta possibilidade também está prevista no enunciado n.º 76 do Fórum Permanente de Juízes Coordenadores dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Brasil.
Ora, se débitos relativos ao consumo podem ser utilizados para a negativação do crédito do consumidor, com mais propriedade se diga desta possibilidade quanto aos alimentos devidos - crédito privilegiado - pois a decisão que fixou os alimentos equipara-se aos títulos de crédito líquidos e certos. Ademais, se o devedor pode ser coagido até mesmo à prisão civil por inadimplemento de alimentos, é bem possível o lançamento dos seus dados nos cadastros de inadimplentes: Quem pode o mais, pode o menos.
Assim, alguns Tribunais já têm aceitado a possibilidade de lançamento dos dados do devedor de alimentos nos cadastros nacionais de proteção ao crédito. É o caso dos Tribunais de Justiça de Pernambuco e São Paulo, precursores da medida, seguidos por vários outros Tribunais pais afora.
Observa-se que a autorização de lançamento dos dados dos devedores de alimentos não atenderia apenas o interesse da parte, no sentido de constranger ao pagamento da sua dívida e evitar as restrições para compras e empréstimos, como também atenderia o interesse coletivo, pois alertaria aos empresários/credores sobre o risco de negociarem com determinado devedor.
De outro norte, o cadastro de informações negativas sobre alguém exige responsabilidade e cautela, já que isto dificulta a movimentação financeira e pode gerar inúmeros prejuízos de ordem econômica.
Dessa feita, a inserção como mau pagador se apresenta como forma de forte coação, por vezes até maior do que a prisão civil, porque o devedor terá realmente problemas de crédito em sua vida e certamente o estimulará a tentar uma composição no processo de execução dos alimentos.
Entretanto, adotando uma postura garantista, entende-se que o melhor momento pra a adoção desta medida, invasiva como se apresenta, seria depois de esgotado o prazo conferido pelo Poder Judiciário ao devedor para que efetue o pagamento, prove que o fez ou justifique a impossibilidade de fazê-lo, desde que não fira o segredo de justiça contemplado nas varas de família, após o exame apurado do processo e constatação cabal da inadimplência.